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Afinal, São Paulo viveu ou não uma bolha imobiliária?

São Paulo – O aumento médio de 192% dos preços dos imóveis em São Paulo nos últimos dez anos, apontado pelo índice FipeZapHistórico, assusta pela intensidade. A valorização é muito maior do que a média registrada em outros países no mesmo período. Mas essa alta exorbitante dos preços é suficiente para determinar que houve uma bolha imobiliária na cidade?

Para Eduardo Zylberstajn, economista da Fipe, se por um lado a alta dos valores dos apartamentos foi algo fora do comum, essa aceleração dos preços não pode ser caracterizada como uma bolha.

Apesar de não haver um consenso sobre o conceito, a principal característica de uma bolha imobiliária é o descolamento de preço dos imóveis da tendência de alta da economia como um todo.

Não foi o que aconteceu na cidade de São Paulo, de acordo com o Índice FipeZap Histórico. A alta dos preços na última década foi proporcional ao aumento da massa salarial da população. “Quando o salário aumenta, há uma disposição maior para gastos com moradia e o imóvel é visto como um bem prioritário”, diz Zylberstajn.

Outros fatores que contribuíram para a alta dos preços foram a queda dos juros no país entre julho de 2011 e início de 2013, e a expansão do crédito imobiliário no período, aponta o economista da Fipe. “A economia brasileira passou a trilhar um novo rumo e os preços acompanharam esse cenário”.

Além disso, parte da alta dos preços pode ser explicada pelo aumento dos custos para construção de imóveis no país. Isso porque, nos últimos anos, o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) foi maior do que a inflação. “Por incrível que pareça, nos últimos quarenta ano, o país não conseguiu diminuir o custo da construção, mesmo com toda a evolução da tecnologia nos canteiros de obras”.

Esse panorama é diferente do que aconteceu com o mercado imobiliário nos Estados Unidos em 2000, compara Zylberstajn. “Ao contrário do nosso país, os Estados Unidos têm uma economia estável. Portanto, a oscilação de preços registrada na época foi artificial e causada por problemas na estrutura do crédito habitacional. Os americanos não passaram a financiar mais imóveis porque sua renda havia aumentado, mas porque podiam se endividar mais”.

No longo prazo, ritmo de aumento de preços no Brasil se equipara ao de outros países

Apesar de uma década de alta acelerada dos preços, iniciada em 2004, o índice FipeZap aponta que, a partir do início da década de 80, os preços dos imóveis haviam passado duas décadas em queda, impulsionados pela renda estagnada da população e pela baixa atratividade do investimento em imóveis.

Os preços dos imóveis variam principalmente em função da renda das famílias e dos juros básicos da economia. Salários em queda afetam o mercado de locação e assustam investidores, enquanto juros altos tendem a tornar o investimento em imóvel menos atrativo. “Com os juros altos, os proprietários tendem a vender seus imóveis para aplicar o dinheiro e aproveitar as altas taxas de juros dos investimentos e quem pensava em comprar um imóvel também acaba preferindo deixar o dinheiro aplicado para aproveitar essa rentabilidade”, diz o economista da Fipe.

O cenário de estagnação da renda da população e queda dos juros na década de 80 e 90, portanto, acabou compensando a disparada dos preços nos últimos anos. Ao longo dos últimos 40 anos, os preços dos imóveis em São Paulo dobraram, o que significa um crescimento de 1,8% ao ano. É o mesmo ritmo de valorização de países desenvolvidos, como Austrália e Alemanha. “A principal diferença é que a oscilação de preços aqui foi muito maior”, diz Zylberstajn.

O economista da Fipe indica que entre os fatores para esse aumento global dos preços no mercado imobiliário, especialmente nas últimas duas décadas, pode ser explicado pela escassez de terrenos nas cidades, já que cada vez mais pessoas querem morar nos grandes centros, e também pelo aumento de renda da população, que fica mais disposta a gastar mais em imóveis.

Preços devem ser corrigidos em cenário mais negativo

Diante do aumento do desemprego, salários em queda e retração do crédito no país, a tendência é de que a alta dos preços vista na última década seja corrigida agora, diz Zylberstajn. “Nos últimos quatro anos, a economia foi muito além do que poderia ou deveria. Agora, podemos esperar uma queda real dos preços”.

Portanto, quem deseja vender um imóvel não deve esperar muito para concluir a operação, recomenda o economista da Fipe. “Verificamos que os preços de imóveis à venda ainda estão estáveis. O comprador está desconfiado, buscando descontos. Quem não negociar pode ter de esperar mais tempo para vender. A cada dia, o vendedor deixa de aproveitar a alta rentabilidade proporcionada por aplicações financeiras atreladas às taxas de juros”.

Com as incertezas do cenário econômico, proprietários acabam optando por disponibilizar seu imóvel para locação, diz Zylberstajn. “Com o aumento de apartamentos para locação e queda na demanda, os preços dos aluguéis vêm caindo. Os proprietários de imóveis estão negociando mais os valores dos aluguéis para conseguir pagar despesas fixas do apartamento, que estão altas agora”. A esperança, diz o economista da Fipe, é que a crise passe sem que seja necessário se desfazer do imóvel por um preço abaixo do planejado.